Uma vez, num bar, ela disse-me: “Neste mundo existem pessoas ‘inamoráveis’, e eu sou uma delas”.
Aquilo
intrigou-me durante toda a noite… uma palavra fora do dicionário que
ela usava para se descrever, e porquê? Observei-a enquanto ela, tímida,
finalizava mais um copo de cerveja. Eu estava com ela havia quatro
horas, quatro horas onde conversamos sobre filosofia, arte, astrologia,
cinema e viagens… Quando ela se dirigia ao empregado de balcão, o bar
inteiro parava para vê-la… Tinha o seu carro, a sua casa e era do tipo
que não dependia de ninguém, então porquê pensar assim? Ter-se-ia ela
fechado para os relacionamentos?
Ela fez uma cara de entediada e
chamou-me para caminhar enquanto fumava um cigarro, até à saída sorriu e
cumprimentou toda a gente com aquele jeito danado de menina do mundo…
Aquilo tudo era muito pequeno e raso para ela, concluí eu.
Na
rua todos passavam apressados, ela divertia-se com os animais
abandonados, abaixou-se e entregou a sua garrafa de água para o morador
da rua, explicou o endereço de um bar em alemão para um estrangeiro
perdido que agradeceu com um sorriso, comprou chicletes de uma criança e
na minha cabeça só ecoava: “inamorável”…
Foram horas a observar
aquela mulher, até não me aguentar e voltar ao assunto… Eu queria
entender melhor, eu queria uma definição como num dicionário. Então ela
pegou na minha mão e puxou-me para um bar onde tocava uma banda de rock,
ficou em silêncio por longos 30 minutos a observar tudo, até que disse:
–
“Olha ao teu redor, estamos aqui já há algum tempo e durante esse tempo
passou por nós uma mulher a chorar porque o seu namorado terminou com
ela ontem e hoje já está com outra, pois ele acredita que pessoas são
substituíveis… naquela mesa estão 10 pessoas e elas não conversam entre
si porque estão nos seus smartphones. Talvez aquela mulher de vermelho
seja a mulher da vida do rapaz de azul, mas ele nunca saberá pois é
orgulhoso demais para tentar. Observa aquele rapaz de pólo no bar, é o
terceiro copo de martini que ele toma enquanto olha para aquela loira,
que por sua vez está a tentar chamar a atenção do vocalista que fingirá
que ela não existe por causa da ruiva e da morena que ele pega em dias
alternados, e ele não pode ficar mal perante as outras.
Olha ao
teu redor, não fazemos parte disso, não somos rasos. Não fazemos mesmo
parte disso! Entrámos sem telefone na mão, na expectativa de encontrar
pessoas simpáticas e interessantes, com conversas interessantes, com
relações reais e voltamos para casa sozinhos, somos invisíveis num mundo
de estatutos onde as pessoas não vão querer-te porque tu moras longe,
ou porque não gostam da tua cor de cabelo ou porque tu não curtes os
Beatles, acontece tudo tão rápido que as pessoas estão com preguiça de
fazer o mínimo de esforço para conhecer realmente alguém. Eu passo por
essa legião como um fantasma pois eles estão ocupados demais para ver
quem está ao redor enquanto procuram alguém no tinder.
E eu
importo-me? Não mais. Sou inamorável porque não me importo com nada
disso. Não me importo com nenhum desse estatuto, não me importo em
quanto tempo levo para conquistar a pessoa, se ela realmente vale a
pena, não me importo se terei que atravessar a cidade para vê-la quando
tiver saudades e não me importo se ela me presentear com um convite para
ir ver o show dos Scorpions porque é importante para ela mesmo eu
detestando a banda. Porque eu sou assim, e se antes era isto que
procurávamos em alguém, hoje em dia somos considerados inamoráveis por
mantermos o coração e a mente aberta.”
Naquele momento eu entendi-a, e apaixonei-me pelo mundo dela.
Texto de Akasha Lincourt
Interessante...
ResponderEliminarÀs vezes (como hoje)tenho inveja de mulheres assim, são do mundo não sendo de ninguém.
ResponderEliminarjinhoooooossssss