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segunda-feira, 29 de março de 2021

Ela não tinha perdido o Amor. Ele é que se tinha perdido dela.

  

Um dia, enquanto passeavam, o Amor distraiu-se com algo, largou-lhe a mão e, quando volveu o olhar, ela tinha desaparecido. Como um louco, deambulou pelas ruas, tentando desesperadamente encontrá-la em cada voz, em cada olhar, em cada boca. Em vão. As palavras que ouvia não eram as dela, o desejo e os sonhos, que lia nos olhos que encontrava, não eram os dela e os lábios que beijava não tinham o sabor dos dela. Ela não estava em lado nenhum. Ela não estava em ninguém.

Ela sabia que ele não encontraria, sozinho, o caminho de volta. Era frágil ainda para grandes façanhas e desnorteava-se com muita facilidade. Precisava que o guiassem, que lhe dessem força e coragem.

Por isso, todos os dias, ela saía de casa, embrenhava-se na multidão e procurava-o. Estava certa de que o encontraria. Bastar-lhe-ia escutar com muita atenção todos os corações. Tinham-lhe contado que os que batem mais forte são os que albergam o Amor. E ela acreditou.

 

sexta-feira, 19 de março de 2021

Porque a vida também se pontua...


 

 As reticências... uso e abuso delas. É a forma que arranjo para não dar o meu pensamento por terminado, para dar a entender que tenho mais para dizer... Como quando não fechamos a porta, mas apenas a encostamos para que seja mais fácil alguém entrar, sem precisar de bater... Lido mal com os pontos finais. São castradores. Não me deixam espaço, impõem-me limites, cortam-me as asas.

A minha vida deveria ser como a minha escrita, cheia de reticências... Não das que denunciam dúvidas, hesitações, mas daquelas que traçam avenidas que se enchem de gente, onde ecoam risos e se oferecem abraços a troco de nada...

A ironia é que sou uma mulher que distribui pontos finais. E se uns são merecidos, outros nem por isso. Preciso de aprender a dar o benefício da dúvida, a conceder oportunidades, a deixar de ter medo. Medo de que gostem de mim.

quinta-feira, 11 de março de 2021

Coisas minhas...


 

  Muita gente não [me] entende. E rotulam-me: "é um bicho do mato". Mas eu sou assim: preciso, muitas vezes, de silêncio e de estar só. E não o escondo de ninguém, não finjo ser companhia, não "faço sala". Seria uma péssima relações públicas, admito. Forçar sorrisos e fazer de conta que sigo conversas ocas só por que sim é algo que dispenso de bom grado. Passo, então, a ser "a esquisita", "a nariz empinado", "a gaja que tem a puta da mania", só porque não escancaro a minha vida na primeira conversa e não promovo à categoria de amigo gente que acabei de conhecer. [Que parvoíce, não é?]
Muita gente não entende que, para mim, viver não tem de ser sempre um arraial, com foguetes e tambores.
Muita gente não entende que eu apenas reclamo o direito ao meu espaço, ao meu tempo, à minha pessoa. E, sendo esse direito meu, exerço-o quando e sempre que eu quiser. Eu apenas me apodero da minha própria existência.

É assim tão difícil de entender?

terça-feira, 2 de março de 2021

Espelho meu...


 

 Pergunto sempre ao espelho o que ele vê em mim, para que eu me veja também. Passo horas com ele em longas e profundas conversas comigo. Aprendi a gostar do meu reflexo batido nele. Aprendi a aceitar as imperfeições que nele via e acolhê-las como parte de mim.
Disse-lhe muitas vezes como gostaria de me ver... E sem saber, depois de muito tempo, soube ver-me e ser exatamente a pessoa que lhe pedia para ser. O espelho não fez nada por mim, apenas me acompanhou e me ouviu... Mostrou-me o seu reflexo intermináveis vezes e fez-me perceber que nem sempre me tratei como merecia. Principalmente por dentro. Passei horas com o meu "eu", para me ver exaustivamente, para me analisar. Para além de me mostrar a imagem de quem eu via, mostrou-me a de quem eu queria ser. E eu aprendi a ser meiga com ele, a não me cobrar tanto e a fazer, da imagem lá reflectida, uma aliada. Aprendi a dirigir-lhe palavras bonitas em vez das habituais palavras de derrota e desconsolo. Passei de me lamentar para me enaltecer. E todos os dias faço isso com ele... Todos os dias um bocadinho do meu tempo é dele... Todos os dias marco um encontro comigo mesma junto dele... e todos os dias eu digo ao espelho: 

"estás tão bonita...!"